A economia do compartilhamento, ou da colaboração, ou uberização, tem suas origens na produção colaborativa de bens, principalmente software, via o modelo open-source. O sistema operacional Linux e seus ascendentes e descendentes são os mais bem-sucedidos exemplos que temos e seu modelo de produção foi (e continua sendo) exaustivamente discutido. Ninguém é dono de nada, o software produzido é de domínio público, a regra é que você pode acrescentar o que achar melhor no sistema operacional, desde que o deixe disponível juntamente com o código produzido, para uso comunitário. Essa ideia simples gerou um ecossistema riquíssimo de produção e distribuição de software livre, em que o ponto forte é a colaboração, a doação de tempo dos participantes para produzir um sistema próprio, testar e utilizar software produzido por terceiros, colaborar na sua melhoria e manutenção para todo o ecossistema.
Uma evolução da ideia foi o modelo peer-to-peer (rede de pares, ou parceiro-a-parceiro) de compartilhamento de bens e serviços. Foi a raiz da enorme mudança no mercado fonográfico que quebrou o modelo baseado em produtos físicos de discos de vinil, fitas cassete e CDs. Com a disponibilidade das redes peer-to-peer, ficou fácil copiar músicas para um formato digital (MP3 e outros) e disponibilizar para uso de parceiros da mesma rede. A indústria fonográfica tentou combater o avanço deste modelo, conseguiu algum sucesso fechando o Shazam, o Napster e outras iniciativas, que mais tarde ressurgiram com pequenas mudanças no modelo. O mais importante: devagar e sempre, a indústria fonográfica como existiu no passado foi sendo engolida pelo novo modelo de negócios. E pelo modelo adotado pela Apple e outros, de tratar a música (e filmes posteriormente) como bits e não como átomos. Hoje os discos de vinil, CDs e fitas cassete são coisa do passado, uma mudança muito rápida, possibilitada principalmente pela disponibilidade da internet. Novas gerações não sabem mais o que é disco de vinil, disco LP ou compacto, fita cassete ou fita de vídeo.
Do Zipcar à Uberização
As mudanças não param por aí e novos negócios apareceram baseados na mesma ideia de colaboração e compartilhamento. O sistema Zipcar foi uma ideia inicial de compartilhamento de carros de aluguel, existente no mundo todo. Carros limpos, tanque cheio, um cartão de crédito específico para abastecimento no porta-luvas do carro, simples, direto e com custo baixo. A evolução natural e disruptiva que veio em seguida foi o Uber e sua turma (Lyft, Sidecar, Gett, Flywheel, Hailo) no compartilhamento de carros e motoristas, e o Airbnb para aluguéis de quartos e casas mundo afora. O Uber ganhou as manchetes pelo seu enorme impacto num setor antigo e forte da economia mundial, o de taxis e carros de aluguel.
A sacudida no setor de taxis, cheio de sindicatos e regulações, aconteceu e continua acontecendo no mundo todo. Muitos interesses são contrariados, por exemplo, o poderoso e rico mercado das cooperativas de táxis na cidade de New York, nos EUA, onde uma licença de taxi (taxi medallion que é afixado na carroceria do carro) chegava a custar mais de US$1.000.000,00 (isso mesmo, um milhão de dólares, valor de 2015!). Claro que a reação é totalmente negativa, e estamos assistindo hoje a uma queda-de-braço entre o status quo e o modelo de compartilhamento que vai aos poucos ganhando espaço e novos usuários. A simplicidade, a enorme oferta, os preços muito mais baixos, a rapidez no atendimento e as oportunidades para quem presta o serviço favorecem tanto o lado do cliente, quanto o prestador de serviço, a despeito de todas as críticas e falhas do modelo, que aos poucos vão sendo corrigidos.
A inovação não vai parar
E o Uber continua firme na inovação e novos produtos: Uber solidário, que é tipo um táxi-lotação; serviços de entrega de produtos que podem ser coletados na rota até sua casa; aluguel de carro, um novo serviço que vai morder e incomodar o enorme setor de aluguel de veículos, atingindo Avis, Hertz, Enterprise, Movida, e um monte de outros. O serviço de aluguel foi anunciado recentemente e vai ser possibilitado dentro do mesmo aplicativo já existente. Podem esperar para breve o compartilhamento e aluguel de bicicletas e motos.
É questão de tempo o avanço deste modelo de negócios baseado em internet. Já discuti isso no meu artigo anterior aqui no portal SIMI (modelos baseados em bits e internet). As empresas não têm acervo físico de nada, apenas manipulam a informação disponível e colocam clientes e prestadores de serviços cadastrados em contato, seguindo firme numa variação do modelo peer-to-peer que apresentei no inicio do artigo. É legítimo o choro e o esperneio dos modelos tradicionais que têm seu interesse contrariado, mas não adianta. O modelo de uberização, como tem sido chamado, está aí para ficar. Para piorar (ou melhorar, depende do ponto de vista) a situação, em cidades onde o Uber foi proibido de operar, surgem redes particulares em paralelo baseadas em Whatsapp e outros aplicativos, seguindo a mesma ideia, colocando motoristas e clientes em contato direto. São redes mais locais, funcionando com a tecnologia disponível na internet, que conseguem fugir do controle e da vigilância, sendo uma variação muito interessante. Mesmo que proíbam o Whatsapp, já existem outros aplicativos similares, onde as mesmas redes podem funcionar. Você acha que é possível mudar isso, parar o crescimento do modelo e suas variações?
Em breve, ninguém mais vai se lembrar do que foi um táxi no passado, podem anotar aí.
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